Por Albany Estrela Herrmann*
Existem coisas que só acontecem comigo! Já dei
muitas risadas contando estes meus “causos” para amigos. Realmente é uma grande
aventura passar um ano longe de casa, da família e dos amigos. É um mundo
totalmente novo para o brasileiro que nunca saiu do país antes. Este foi o meu caso...
Resolvi dividir com vocês alguns momentos hilários acontecidos durante o
período que fui estudante de intercâmbio. Vamos lá! Como sou a rainha das
listinhas, tinha que fazer mais uma escolhendo os melhores momentos…
1 - Dentro do ônibus a caminho da universidade
Sentada dentro do ônibus lotado a caminho da cidade universitária. Vejo um rapaz com uma mochila enorme e outras coisas. Ofereci ajuda para carregar a bolsa dele no meu colo.
Ele me olha como se eu tivesse dito: - Passa a grana! Mãos ao alto. Isto é um assalto!
Repito a oferta: - Mochila? No colo? Ajudar você? E ele concorda, depois de se recompor do susto.
Por coincidência, ele desce no mesmo lugar e pede desculpas pela reação. Ele nunca viu isso aqui na Alemanha... Eu disse que isso é normal no Brasil: levantar e oferecer o lugar para pessoas mais velhas, mulheres com crianças e também segurar as bolsas de alguém que está de pé...
Ele agradeceu mais uma vez. Pediu desculpas mais uma vez e disse: - Vivendo e aprendendo!
Eu: - Pois é! Vale a pena ajudar os outros sem esperar nada em troca!
2 – Pedindo informação na rua para achar o endereço do alojamento
Lá estava euzinha, andando pela rua, perdida,
arrastando a minha mala, tentando achar o caminho para o alojamento. O mapa que
estava levando, não me ajudava muito. Resolvi perguntar para um passante qual era a
plataforma correta e linha para que eu pudesse pegar o ônibus.
Eu: - Por favor, Senhor! Uma informação?!
Alemão
estendendo a mão quase me acertando: - Não! Não quero comprar NADA!
Eu: - Mas quem disse que eu
tô vendendo alguma coisa!? Cada
uma!
O jeito foi perguntar ao motorista que estava na
pausa… Ele aponta para uma plaquinha no ponto do ônibus sem dizer uma palavra e
me ignora.
Eu:
- Vou ter que ler todas as placas de todas as paradas até encontrar a minha…
3 – O zelador do prédio. Chaves do quarto? E agora, José?
No térreo do prédio ficava a sala de atendimento
do zelador. Nenhuma alma viva e silêncio absoluto. Já estava com vergonha de quebrar tamanho
silêncio para bater na porta, mas não havia outra maneira… Quando ia bater,
reparei uma lista com horários e dias da semana colada do lado de fora da
porta. Por coincidência, o próprio vinha chegando:
Ele:
- Não está no horário de atendimento!
Eu: - Mas eu acabei de chegar do Brasil e não
tenho as chaves do meu quarto! Já com os olhos cheios de água imaginando passar a noite do lado de fora e virando picolé...
Ele:
- Bem, vou "quebrar o seu galho" hoje e meu deu as chaves do quarto.
4 – A lavanderia do prédio
Depois de descer munida de uma cesta cheia de
roupas sujas de um lado e de meu dicionário na outra mão, encontrei a
lavanderia. Lá dentro 3 máquinas funcionando e em cima de
cada uma delas, um papel e uma caneta. Em cima de cada máquina um contador
de moedas do tipo telefone antigo. O display das máquinas parecia
mais um hieróglifo egípcio, até mesmo porque elas funcionavam tanto no sentido
horário quanto no sentido inverso.
Eu: - Nossa, quantos programas para lavar
roupa! Qual que eu uso?
Penso: - Vamos abrir o meu “pai dos burros” vulgo dicionário
e ver o que eu consigo decifrar...
Traduzi algumas palavras que não conhecia,
mas não foi suficiente para entender como aquilo tudo funcionava. Vou esperar
alguém entrar aqui para perguntar. Só não vale a pessoa apontar para as máquinas
sem dizer uma palavra que eu dou um treco aqui! Espero,
espero e espero. Entra um cara enorme, de cabelos vermelhos e usando um óculos
fundo de garrafa.
Eu: - Você poderia me ajudar, por favor? Aonde eu
posso comprar estas moedas para lavar roupa? E qual é o programa que você usa?
Ele: - Ah, você tem que ir no horário de
atendimento do zelador (Sprechstunde). E estas máquinas são lavadoras e
secadoras ao mesmo tempo…
Eu pensei: - O cara foi gente fina comigo. Vou lá
ver se ele me atende. E atendeu! Just in case, eu comprei logo 3 moedas.Vai que preciso de mais de uma...
Voltei para a lavanderia, coloquei as roupas na
máquina vazia, o sabão em pó, jogo a moeda e aperto o botão para iniciar a
lavagem. Nada.
Penso: - Acho que rodei para o lado errado, vou girar o botão só…
mais… um… pouqui… Nããão! O display apagou todo. O que eu
fiz?!
O “cara pálida” ainda estava lá e disse: - Xi, você perdeu a moeda! Vai precisar de mais uma!
Eu: - *&%$§?!
Respiro fundo e pergunto: - Você pode me ajudar? Não
quero perder mais outra moeda!
Ele: - Me dá a moeda aqui!!! Zack, zack, zack.
Pronto!
Volte depois de 1h para buscar a sua roupa e liberar a máquina para o
próximo. Se você não fizer isso, o próximo tem o direito de jogar as suas
coisas em qualquer lugar.
Eu voltei para o quarto e ficava olhando quase
que de minuto em minuto se já estava na hora de ir buscar a minha roupa. Que
estresse!
A lavanderia |
5 – No supermercado
Barriga roncando, hora de procurar um
supermercado ou lojinha que venda algo comestível. Pelo menos o básico: café,
pão, leite e açúcar… Pertinho do alojamento, encontrei um supermercado. Entrei
e fui pegando as coisas que precisava. Caminhei em direção ao caixa e entrei na
fila.
Aqui na Alemanha a pessoa que trabalha no caixa, passa tudo correndo, na
velocidade da luz e num piscar de olhos fala o valor em voz alta.
Eu fiquei
correndo para enfiar as coisas dentro da bolsa, mas quando a gente fica
nervosa, aí é que cai tudo no chão, pacote abre, carteira arrebenta o zíper,
enfim, brasileiro pressionado, torce o pé até parado! Depois do “Deus nos
acuda” e do corre-corre do caixa, recebo o troco e jogo tudo no fundo da bolsa
para sair dali o quanto antes.
Eu era feliz e não sabia! No Brasil você bate até papo com a tia do caixa! Aqui a compra é feita em
questão de segundos… E ai de você se o produto não tiver o preço ou se você
quiser fazer alguma pergunta! A galera já começa a revirar os olhos ou a
reclamar para abrir uma outra caixa!
Cheguei em casa louca para tomar um cafezinho
brasileiro que tinha levado na mala. Café pronto, um pinguinho de leite e o
açúcar. Coloquei uma colher do açúcar e para o meu espanto o café começou a virar um tipo
de pudim e endureceu. O vizinho de quarto entrou na cozinha naquele momento…
Ele: - Deixa eu ver o que você comprou? Ah! E fala rindo: - Você comprou
açúcar de fazer geléia!
Eu: - E têm tipos diferentes?
Ele: - Tem açúcar com baunilha, açúcar comum, açúcar de geléia e etc…
Eu entorno o café na pia e volto no supermercado
para comprar o açúcar certo desta vez.
6 – Fazendo um bico de faxineira nas férias
Para ganhar uma graninha durante as férias, fui fazer faxina aos sábados
na casa de uma família alemã que tinha uma filha de 6 anos e uma gata chamada
Nina. Normalmente
a dona da casa saía para fazer compras e me deixava sozinha fazendo o serviço.
Ela
deixava um bilhetinho em cima da mesa com as instruções do que eu tinha que
fazer. Naquele dia, ela queria que eu passasse o aspirador na casa inteira e
jogasse o lixo fora.
Entrei, pendurei a minha bolsa no corredor e fui
buscar o aspirador depois de ler as tarefas do dia. A Nina estava em cima de um
armário da sala, cochilando numa boa… Liguei o aspirador e comecei a limpar a
casa quando a gata pulou irada em cima de mim com os olhos arregalados e os
dentes para fora.
Eu, depois de um grito de susto: - Mas que gata neurótica é eeeeessaaaaa?
Sai correndo e abri a porta da varanda. A gata do lado de fora, miando e pedindo para entrar de novo.
Eu: - Vai ficar aí no frio até eu terminar de
limpar a casa! Quem mandou dar uma de ninja pra cima de mim?
A Nina Ninja |
7 – O Tandempartner
Querendo dar uma lapidada na pronúncia, resolvi buscar um Tandempartner.
Encontrei um papel na universidade. Aluno de Medicina procura Tandem de Português
do Brasil. Rasguei o papelzinho e levei para casa. Liguei para ele marcando a primeira aula. Eu
ensino Português para você e você estuda Alemão comigo. Cada um tem uma hora de
aula.
O primeiro encontro foi na cafeteria (território neutro), o segundo
encontro também. No terceiro encontro, ele sugeriu ir estudar na casa dele. Eu
disse que achava a cafeteria legal.
Ele
não desiste: - Eu queria saber se você quer ser minha “amiga de pele”…
Eu:
- Desculpe a minha ignorância, mas o que é isso?
Ele:
- Ah, é uma amiga especial! Assim, de tocar na pele, sabe?
Eu:
- Hein? Você quer dizer “amizade colorida”?
Ele:
- Acho que deve ser isso em Português…
Eu: - Não, obrigada. Eu
quero mesmo é só fazer o Tandem e mais nada!
Ele: - Mas por que não? Eu
não sou bonito? E eu sou médico!
Eu: - Bom para você, mas eu
não estou interessada!
Ele: - Mas eu já tive duas
„amigas de pele“ brasileiras!?
Eu: - Mas eu não sou a
terceira! E acabei com o Tandem…
8 – Pedindo ao amigo para trazer um pão do supermercado
Estou eu olhando as modas, debruçada na janela do
quarto quando um amigo passa a caminho do mercado.
Ele pergunta se eu queria alguma coisa de lá. Eu peguei
uma moeda de 5 Marcos e joguei pela janela para ele pegar. Afinal de contas eu morava no terceiro andar e
não era tão alto assim.
A moeda caiu exatamente dentro do bueiro da canalização,
ultrapassando uma fenda de apenas alguns milímetros! Meu amigo ainda tentou
levantar a tampa e salvar a minha merreca, mas não tive chances. Ele pagou do
próprio bolso e eu agradeci por sua compaixão…
Eu da janela: - *&%$§?! Só
acontece comigo isso! A moeda de 5 Marcos é enorme!!!!
9 – Voltando tarde da noite de uma festa estudantil
Voltei para casa com minha melhor amiga já lá pelas tantas da noite. Ela morava no terceiro andar e eu no oitavo (eu
tinha mudado de alojamento por causa do aluguel mais barato e da localidade)…
Apertamos o botão do elevador, a porta se abriu e vimos um rapaz dentro, caído no chão, todo sujo de vômito e urina.
Apertamos o botão do elevador, a porta se abriu e vimos um rapaz dentro, caído no chão, todo sujo de vômito e urina.
As duas em coro: - Eca!
Minha amiga: - Vou subir a pé mesmo!
Eu: - Putz! Você
mora no terceiro! E eu que moro no oitavo e dancei a noite toda? Vou ter que
encarar a subida, pois se eu entrar no elevador com o sujeito e ele acorda, eu
não vou poder correr dele!
10 – Declaração de amor bombástica
A campainha do meu quarto tocou. Pego o interfone e pergunto quem é. Sem resposta. Levanto e vou à porta principal. Encontro um
rapaz que conheci num churrasco na casa de amigos brasileiros. Eu não estava querendo receber visitas, mas tratei-o de forma bem
diplomática.
Eu:
- Oi, como vai? Tudo bem? Aconteceu alguma coisa?
Ele:
- Eu queria falar com você! Vamos dar uma voltinha?
Eu
penso: - Na verdade não queria… Respondo: - Espera um minuto que eu já volto.
Ele:
- Vamos descer o morro e dar um passeio no parque da cidade?
Eu: - Pode ser. Vamos sim.
Ele totalmente sem jeito e descendo o morro a passos largos: - Eu pensei
muito em você depois daquele churrasco e queria perguntar… (passo largo descendo o morro)… se você… (passo largo e solta um
pum sonoro involuntário)… queria... namorar… (passo largo morrendo de vergonha)…
comigo.
Eu penso: - Coitado! Estava fazendo um esforço tão
grande para se declarar e na hora h acontece isso (Declaração de amor com direito a "defeitos especiais" he he he)!
Vou fazer uma piadinha para aliviar a situação:
Vou fazer uma piadinha para aliviar a situação:
Eu:
- É isso aí, não paga aluguel tem que sair mesmo!!!! He he he!
Original em alemão: - So ist
das! Wer keine Miete zahlt, muss raus!!!!
AGRADECIMENTO:
Recebi elogios via emails particulares de jornalistas, autores e tradutores profissionais. Isto é prova suficiente para mim! Amei poder ouvir de pessoas que eu respeito e admiro, frases do tipo:
- Albany, me diverti pacas lendo alguns de seus textos.
Ou ainda: - Comecei o dia super bem humorado e rindo muito depois de ler seu post.
Estas pessoas citam as fontes, divulgam meu blog, fazem comentários e críticas saudáveis.
Enriquecem a alma, me ensinam a ser uma pessoa/profissional melhor e compartilham comigo o interesse pela arte de escrever/ler, de se comunicar interculturalmente, e por fim de colocar um sorriso no rosto de muitos com um jeito brincalhão de ser...
- Albany, me diverti pacas lendo alguns de seus textos.
Ou ainda: - Comecei o dia super bem humorado e rindo muito depois de ler seu post.
Estas pessoas citam as fontes, divulgam meu blog, fazem comentários e críticas saudáveis.
Enriquecem a alma, me ensinam a ser uma pessoa/profissional melhor e compartilham comigo o interesse pela arte de escrever/ler, de se comunicar interculturalmente, e por fim de colocar um sorriso no rosto de muitos com um jeito brincalhão de ser...
* Professora de Português para
Estrangeiros na VHS de Stuttgart, Licenciada em Letras Português e Alemão
pela Universidade Federal Fluminense do Rio de Janeiro e Mestre em Filologia
Românica pela Eberhard Karls Universität de Tübingen, Alemanha.